Até aqui, foi visto que a proteção jurídica da dignidade envolve o ser humano. No entanto, é possível estender essa proteção ao meio ambiente também.
MEIO AMBIENTE COMO DIREITO AUTÔNOMO OU COMO DERIVAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS (GREENING OU ESVERDEAMENTO DOS DIREITOS HUMANOS)
Segundo a Corte Interamericana, o direito ao meio ambiente é um direito autônomo. Fica superado o entendimento anterior de que o meio ambiente era um direito decorrente de direitos civis e políticos, como, por exemplo, o direito à vida e à integridade física.
Entendia-se, portanto, que o direito ao meio ambiente sadio não era um direito autônomo, mas, sim, um direito protegido de forma indireta. Tratava-se do fenômeno conhecido como greening ou esverdeamento dos direitos humanos.
Assim, o greening ou esverdeamento dos tratados internacionais de direitos humanos nada mais é do que um uso indireto dos mecanismos de proteção dos direitos civis e políticos com o objetivo de se resguardar direitos ambientais1.
MEIO AMBIENTE NA JURISPRUDÊNCIA DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS: PERSONALIDADE JURÍDICA PRÓPRIA
A partir do Caso Lagos del Campo vs. Peru, a Corte Interamericana passou a entender que a proteção judicial do direito ao meio ambiente sadio não era mais uma simples decorrência dos direitos civis e políticas (proteção indireta). Em referido caso, a Corte Interamericana passou a entender que o direito ao meio ambiente sadio é um direito autônomo, e não uma simples decorrência dos direitos civis e políticos2.
Nesse sentido, segundo a Corte Interamericana, o direito ao meio ambiente sadio, como direito autônomo, diferente de outros direitos, protege os componentes do meio ambiente, como bosques, rios, mares e outros, como interesses jurídicos em si mesmos, mesmo que não haja evidências sobre o risco às pessoas individuais3.
Daí que o meio ambiente passa a ser protegido não apenas pela sua utilidade e conexão com o ser humano. Proteger a natureza não significa somente respeitar outros direitos do ser humano, como a saúde, a vida ou a integridade pessoal. Proteger a natureza significa, também, observar a sua importância para os demais organismos vivos com quem se compartilha o planeta, organismos, esses, também merecedores de proteção em si mesmos4.
Em razão disso, a Corte Interamericana reconhece que o direito ao meio ambiente sadio é um direito com personalidade jurídica própria. Pode-se, então, dizer que o princípio da dignidade não tutela apenas o ser humano, mas, também, os direitos da natureza, os quais também contam com dignidade própria, e são fins em si mesmos nem sempre necessariamente ligados aos direitos do ser humano, como vida, integridade pessoal, entre outros5.
Então, na visão atual da Corte Interamericana, é possível se falar em dignidade ou personalidade jurídica própria da natureza ou do meio ambiente.
Postas essas considerações, o direito ao meio ambiente, em termos de proteção jurisdicional, é um direito autônomo, e não uma simples decorrência dos direitos civis e políticos (greening ou esverdeamento dos direitos humanos).
Por ser um direito autônomo, o direito ao meio ambiente sadio tem a sua dignidade própria a ser protegida, como fim em si mesmo, e não como algo que simplesmente serve o ser humano. Daí a possibilidade de se reconhecer a personalidade jurídica do direito ao meio ambiente sadio ou dos direitos da natureza.
1WAGNER, D. F.; SOUZA, F. S. O “esverdeamento” da Convenção Americana de Direitos Humanos: povos indígenas e proteção ambiental em convergência. Veredas do Direito, Belo Horizonte, v. 19, n. 43, p. 383, jan./abr. 2022. Disponível em: http://www.domhelder.edu.br/revista/index. php/veredas/article/view/2159.
2PAIVA, Caio; HEEMANN, Thimotie Aragon. Jurisprudência internacional dos direitos humanos, pág. 509. 3ª ed. Belo Horizonte: CEI, 2019.
3CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Opinião Consultiva nº 23/2017, de 15 de novembro de 2017, §62.
4CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Opinião Consultiva nº 23/2017, de 15 de novembro de 2017, §62.
5CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Opinião Consultiva nº 23/2017, de 15 de novembro de 2017, §62.