Segundo a finalidade, os direitos humanos podem ser classificados em direitos propriamente ditos e em garantias fundamentais.
As garantias fundamentais, por sua vez, subdividem-se em: 1º) Garantias em sentido amplo e garantias em sentido estrito; 2º) Garantias nacionais e garantias internacionais.
Já as garantias fundamentais em sentido amplo subdividem-se em: 1º) Garantias institucionais públicas; 2º) Garantias institucionais privadas;
Por ora, é preciso saber que os direitos propriamente ditos são os dispositivos normativos que contemplam uma pretensão jurídica relacionada à dignidade de todo ser humano.
Já as garantias fundamentais são aqueles dispositivos normativos que preveem os meios pelos quais se busca assegurar a efetivação dos direitos juridicamente reconhecidos.
Confiram-se, também, os DIREITOS HUMANOS SEGUNDO AS FUNÇÕES, TEORIA DOS 4 STATUS e PARTE 2: TEORIA DOS 4 STATUS (JELLINEK).
DIREITOS PROPRIAMENTE DITOS
Os direitos propriamente ditos são os dispositivos normativos que preveem pretensões jurídicas relacionadas à dignidade de todo ser humano. Exemplo: o art. 5º, IV, da CF/88 contempla o direito à livre manifestação do pensamento. Esse dispositivo constitucional tem a natureza jurídica de direito propriamente dito.
Por sua vez, o acesso à justiça é um dos meios pelos quais o direito à livre manifestação do pensamento pode viabilizar-se. Por isso, se a manifestação do pensamento é um direito propriamente dito, o acesso à justiça é uma garantia fundamental.
Confira-se o CONTEÚDO MÍNIMO DA DIGNIDADE HUMANA.
GARANTIAS FUNDAMENTAIS
As garantias fundamentais são os dispositivos normativos que asseguram o respeito e a proteção dos direitos humanos. Há algumas subespécies de garantias fundamentais, conforme logo adiante se verá.
GARANTIAS FUNDAMENTAIS EM SENTIDO AMPLO E GARANTIAS FUNDAMENTAIS EM SENTIDO ESTRITO
As garantias fundamentais em sentido amplo são um conjunto de meios, de natureza institucional e organizacional, com o objetivo de se assegurar o respeito e a garantia dos direitos humanos. Referidas garantias em sentido amplo também podem ser denominadas de garantias institucionais, já que contemplam estruturas institucionais que viabilizam a efetivação dos direitos humanos.
Por sua vez, ainda em sede de garantias em sentido amplo, as garantias institucionais podem ser: a) garantias institucionais públicas: aqui os dispositivos normativos preveem instituições públicas garantidoras de direitos (ex.: Ministério Público, Defensoria Pública); b) garantias institucionais privadas: aqui os dispositivos tratam de instituições privadas que se destinam a efetivar direitos humanos (ex.: liberdade de imprensa, casamento, família, paternidade, maternidade).
Já as garantias fundamentais em sentido estrito são dispositivos normativos que preveem instrumentos processuais ou procedimentais que servem para efetivar os direitos humanos. No plano nacional, temos os remédios constitucionais (ex.: mandado de segurança, habeas corpus, mandado de injunção, habeas data, direito de petição, ação civil pública, ação popular). No plano internacional, temos o direito de petição inicial a órgãos quase judiciais, de modo que a pessoa pode buscar acesso à Comissão Interamericana de Direitos Humanos ou a Comitês criados por determinados tratados celebrados no âmbito da Organização das Nações Unidas. No Brasil, porém, o indivíduo não tem acesso direito à Corte Interamericana (jus stand), mas, proposta a demanda internacional, o indivíduo tem amplo direito à produção de provas e à apresentação de alegações escritas (locus stand in judicio).
Em termos de garantias fundamentais em sentido estrito, por meio da Opinião Consultiva nº 8/87, solicitada pela Comissão Interamericana, a Corte Interamericana considerou que o habeas corpus é uma espécie de garantia judicial que jamais pode ser suspensa, mesmo em situações de emergência. Para chegar a essa conclusão, a Corte interpretou o art. 27 da CADH, que cuida da suspensão de garantias.
GARANTIAS EM SENTIDO AMPLO: B1) GARANTIAS INSTITUCIONAIS PÚBLICAS; B2) GARANTIAS INSTITUCIONAIS PRIVADAS
Já se viu que as garantias fundamentais em sentido amplo são os meios indispensáveis, de natureza institucional e organizacional, destinados à efetivação dos direitos humanos.
As garantias fundamentais em sentido amplo ou garantias institucionais subdividem-se em: a) garantias institucionais públicas; b) garantias institucionais privadas.
As garantias institucionais públicas são dispositivos normativos que cuidam de meios de natureza institucional e organizacional, de tal forma que os direitos humanos possam ser preservados e efetivados.
Há alguns exemplos que ilustram as garantias institucionais públicas:
1º) Garantia diante do Poder Legislativo: é o conjunto de meios institucionais e organizacionais que impõem ao Poder Legislativo o dever de legislar de acordo com os direitos humanos. Nesse sentido, a Constituição Federal estrutura diversos direitos, elevando-os à categoria de normas constitucionais, em posição jurídica superior às leis. Em seguida, a mesma Constituição promove uma estruturação institucional pública importante, que é o controle de constitucionalidade, de modo tal que as leis violadoras desses direitos de cunho constitucional se tornem inválidas. Nesse sentido, mesmo uma emenda constitucional que tenda a abolir os direitos e as garantias individuais é tida como inconstitucional (CF/88, art. 60, §4º, IV). Todos os dispositivos constitucionais que criam essa estruturação jurídica (direitos de natureza constitucional, controle de constitucionalidade) são garantias diante do Poder Legislativo, logo, garantias institucionais públicas.
2º) Reserva de lei para o Poder Público: o Poder Público deve atuar nos limites da lei (CF/88, art. 37), o que configura uma garantia institucional de proteção ao indivíduo.
3º) Cláusula de reserva de jurisdição ou reserva absoluta de jurisdição: é a exigência de autorização judicial para que haja a restrição de certos direitos. Eis os direitos para cuja restrição é preciso autorização ou intervenção judicial, de acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal: a) busca domiciliar (CF/88, art. 5º, XI; b) interceptação telefônica (CF/88, art. 5º, XII); c) decretação de prisão, salvo flagrante delito (CF/88, art. 5º, LXI); d) instauração de inquérito policial, sem a supervisão do controle judicial pelo Tribunal de Justiça, na hipótese de foro por prerrogativa de função (CF/88, art. 29, X). Por sua vez, a quebra ou transferência de sigilo bancário, fiscal e de registros de dados telefônicos não se sujeitam à cláusula de reserva de jurisdição, tanto é que podem ser determinadas inclusive por Comissão Parlamentar de Inquérito.
Cumpre saber se a audiência de custódia está sujeita à cláusula de reserva de jurisdição. A resposta é positiva. Nos termos do art. 7.5, da CADH, toda pessoa presa, detida ou retida tem direito a ser conduzida, sem demora, a um juiz ou a outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais. Nesse sentido, não basta apresentar uma pessoa presa a um integrante do Ministério Público, o qual não conta com poder judicial, de modo que não pode afastar uma prisão ilegal e, assim, garantir o direito de liberdade e de integridade pessoal.
A propósito, é insuficiente a simples comunicação da prisão a uma juíza ou a um juiz. É preciso que a pessoa presa seja rapidamente encaminhada à presença dessa autoridade judicial.
A audiência de custódia tem por objetivo verificar se a prisão se deu conforme a lei, de modo que a juíza ou o juiz verifica, até mesmo, se a pessoa presa sofreu algum abuso por parte dos policiais que efetivaram a prisão. Não se analisam os fatos que ensejaram a prisão. A autoridade judicial, isto sim, verifica se a pessoa permanecerá presa ou não.
Nos termos do art. 7.5 da CADH, toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de uma autoridade judicial. Não importa a natureza da prisão. Por isso, segundo o art. 13, caput, da Resolução CNJ nº 213, de 15.12.2015, com a redação dada pela Resolução CNJ nº 562, de 3.6.2024, a audiência de custódia se aplica às pessoas presas em decorrência de cumprimento de mandado de prisão cautelar ou definitiva, ou mesmo de alimentos – além, é claro, dos casos mais comuns de prisão em flagrante (Resolução CNJ nº 213, de 15.12.2015, art. 1º, caput).
Nos termos do art. 11 da Resolução CNJ nº 213, de 15.12.2015, “havendo declaração da pessoa presa em flagrante delito de que foi vítima de tortura e maus tratos ou entendimento da autoridade judicial de que há indícios da prática de tortura, será determinado o registro das informações, adotadas as providências cabíveis para a investigação da denúncia e preservação da segurança física e psicológica da vítima, que será encaminhada para atendimento médico e psicossocial especializado”.
Portanto, quando presa, a pessoa tem o direito de ser apresentada, sem demora, a uma autoridade judicial. A audiência de custódia é matéria sob reserva absoluta de jurisdição, de modo que apenas autoridades judiciais poderão realizar esse ato.
4º) Estruturação jurídico-normativa do Ministério Público e da Defensoria Pública: o Ministério Público e a Defensoria Pública são duas instituições indispensáveis para a efetivação de direitos. No caso do Ministério Público, o novo perfil assumido a partir da Constituição Federal de 1988 implica o reconhecimento de prerrogativas fundamentais, no que se refere à autonomia financeira e administrativa da instituição, ao processo de escolha, nomeação e destituição do titular e, também, ao poder de iniciativa de projetos de lei relacionados à organização dessa instituição. É por isso que a Corregedoria do Poder Judiciário de Goiás não poderia nomear Promotor Ad hoc, isto é, para um ato específico, sob pena de ferimento à independência e à autonomia do Ministério Público.
A organização e a estruturação do Ministério Público e da Defensoria Pública são verdadeiras garantias institucionais públicas, já que delas depende a proteção dos direitos humanos no Brasil. Suprimir essa configuração institucional implica amesquinhar os direitos fundamentais. Se os direitos fundamentais são cláusulas pétreas, que por isso não podem ser suprimidos nem mesmo por emendas constitucionais (CF/88, art. 60, §4º, IV), os órgãos e instituições garantidores desses direitos, com as respectivas prerrogativas de independência e autonomia, não podem ser eliminados. Caso contrário, haveria uma supressão, por tabela, dos próprios direitos fundamentais que são intangíveis (cláusulas pétreas).
No que se refere às garantias institucionais relacionadas à Defensoria Pública, é possível mencionar o seguinte:
a) Por meio da EC 35/2004, da EC 74/2013 e da EC 80/2014, foi atribuída às Defensorias Públicas dos Estados e da União autonomia funcional, administrativa e financeira. Assim, as Defensorias Públicas transformam-se em instituição sem subordinação ao Poder Executivo, podendo atuar com independência funcional.
b) As Defensorias Públicas são instituições que viabilizam a efetivação de direitos. Em razão disso, são de eficácia plena e aplicabilidade imediata as normas constitucionais que atribuem autonomia funcional e administrativa às Defensorias Públicas, como é o caso do art. 134, §2º, da CF/88, com a redação dada pela EC 45/2005. A propósito, esse dispositivo constitucional impede que uma lei estadual insira a Defensoria Pública na estrutura do Poder Executivo Estadual, inclusive se essa vinculação se der à Secretaria Estadual de Justiça e Direitos Humanos.
c) As Defensorias Públicas Estaduais contam com autonomia administrativa e financeira, de modo que estão contempladas com iniciativa da própria proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias (CF/88, art. 134, §2º, com a redação dada pela EC nº 45/2004). Por sua vez, em termos de competência legislativa concorrente (CF/88, art. 24), a lei estadual deve observar as prescrições contidas na lei federal. Logo, as leis estaduais que tratem das Defensorias Públicas Estadual devem seguir as prescrições gerais contidas da LC nº 80/94. Em razão da autonomia administrativa e financeira das Defensorias Públicas Estaduais e da competência legislativa concorrente para legislar sobre as Defensorias Públicas Estaduais, temos o seguinte: 1º) É inconstitucional lei estadual que possibilita ao Governador do Estado a prerrogativa de nomear ocupantes de cargos administrativos na estrutura de Defensoria Pública Estadual (Subdefensor Público Geral, Corregedor Geral, Defensores Chefes, Ouvidor da Defensoria Pública Estadual); 2º) É inconstitucional lei estadual que atribua ao Governador do Estado a iniciativa legislativa para propor o subsídio dos membros da Defensoria Pública.
d) É inconstitucional a lei estadual que confere à Assembleia Legislativa a prerrogativa de convocar os membros da Defensoria Pública.
e) Nos termos do art. 98, caput, e §2º, do ADCT, a lotação dos Defensores Públicos deve ser proporcional à demanda e à respectiva população, com prioridade para as regiões com maior índice de exclusão social e adensamento populacional. Caso a direção da Defensoria Pública adote esses critérios constitucionais, o Poder Judiciário não poderá determinar a lotação de Defensor Pública em localidade desamparada, sob pena de ofensa à autonomia administrativa das Defensorias Públicas. Eis a tese de repercussão geral fixada pelo Supremo Tribunal Federal: “Ofende a autonomia administrativa das Defensorias Públicas decisão judicial que determine a lotação de defensor público em localidade desamparada, em desacordo com os critérios previamente definidos pela própria instituição, desde que observados os critérios do art. 98, caput, e § 2º dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT”.
f) A Defensoria Pública tem iniciativa para realizar a própria proposta orçamentária, dentro dos limites assinalados pela lei de diretrizes orçamentárias (CF/88, art. 134, §§2º e 3º). Em razão disso, o Poder Executivo não poderá, de forma unilateral, reduzir a proposta orçamentária da Defensoria Pública, mas, sim, incorporar essa proposta ao Projeto de Lei Orçamentária Anual, nos exatos termos que for recebida a referida proposta. O que poderá o Poder Executivo fazer, no máximo, é propor ao Poder Legislativo a redução do valor da proposta. O Poder Legislativo, então, é que tem atribuição para manter ou reduzir a proposta orçamento da Defensoria Pública, no âmbito do Projeto de Lei Orçamentária Anual.
g) Nos termos do que dispõe o art. 168 da CF/88, é dever do chefe do Poder Executivo efetuar o repasse, sob a forma de duodécimos e até o dia 20 de cada mês, da integralidade dos recursos orçamentários que se destinam à Defensoria Pública pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para o exercício financeiro. Esse dever de repasse inclui as parcelas já vencidas, bem assim eventuais créditos adicionais destinados à instituição.
5º) Estado laico: é o que promove a separação administrativa entre Estado e Igreja, estabelecendo a liberdade de crença. Já o Estado confessional é o que adota, oficialmente, uma ou mais religiões. A CF/88 estruturou, normativamente, o Estado laico, da seguinte maneira: a) o art. 5º, incisos VI, VII e VIII, consagra, como direito e garantia fundamental, a liberdade de crença e consciência e a proteção ao livre exercício desses direitos; b) o art. 19, I, estipula a separação administrativa entre Estado e Igreja, proibindo as relações de dependência ou aliança, mas permitindo, nos termos da lei, a colaboração de interesse público. A configuração do Estado laico é uma garantia fundamental institucional pública, já que permite a realização dos direitos fundamentais ligados à liberdade de crença. Isso permite a aceitação, pelo Estado, do direito a ter uma religião ou, mesmo, de não ter religião nenhuma.
6º) Garantia institucional da anuidade eleitoral: segundo o art. 16 da CF/99, “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”. Para que não haja alterações eleitoras bruscas, a nova eleitoral só se aplica às eleições que acontecerem após um ano da vigência dessa nova lei. Trata-se da garantia institucional da anualidade, segundo reconheceu o Ministro GILMAR MENDES.
7º) Imunidade parlamentar: trata-se de uma garantia institucional conferida ao Congresso Nacional, de modo que o parlamentar não pode renunciar à imunidade parlamentar.
Postos esses exemplos de garantias institucionais públicas, passemos a cuidar das garantias institucionais privadas, que são um conjunto de dispositivos que tratam de diversas instituições de índole privada, como o casamento, a família, a imprensa, a opinião pública. Essas instituições privadas viabilizam a realização de diversos direitos humanos, daí se revelando como verdadeiras garantias institucionais privadas, merecendo proteção especial. Eis alguns exemplos de garantias institucionais privadas:
1º) União homoafetiva como centro irradiador de direitos humanos: na Opinião Consultiva nº 24/17, o Estado da Costa Rica consultou a Corte Interamericana sobre o seguinte, entre outros temas: a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), que é um tratado internacional de direitos humanos, permite a proteção de direitos nas uniões entre pessoas do mesmo sexo?
Assim, a Corte Interamericana emitiu a Opinião Consultiva nº 24/17, vindo a estabelecer que a CADH impõe ao Estado o dever de proteger os direitos decorrentes da união entre as pessoas do mesmo sexo. Entre esses direitos, estão o direito ao matrimônio e o direito à proteção patrimonial (como é o caso do direito de herança).
Para chegar a essa conclusão, a Corte Interamericana interpretou os seguintes dispositivos da CADH: a) Art. 1.1 da CADH: estipula o dever de os Estados respeitarem e garantir direitos, sem discriminação; b) Art. 2 da CADH: estabelece o dever de os Estados adotarem disposições de direito interno para tornar efetivos os direitos humanos previstos na CADH; c) Art. 11.2 da CADH: prevê o direito à vida privada; d) Art. 17 da CADH: estipula o direito à proteção da família; e) Art. 24 da CADH: estabelece o direito à igualdade perante a lei.
Referidos dispositivos normativos da CADH são garantias institucionais privadas, que viabilizam a realização dos direitos humanos decorrentes da união homoafetiva.
2º) Liberdade de expressão e de manifestação do pensamento como instrumento viabilizador de outros direitos individuais e de direitos aplicáveis a toda a sociedade: A Lei nº 4.420/69, de Costa Rica, exige de jornalistas diploma universitário e filiação ao Conselho Profissional dos Jornalistas. Por meio da Opinião Consultiva nº 5/1985, solicitada pela Costa Rica, a Corte Interamericana entendeu que essa exigência viola o direito à liberdade de expressão e de pensamento, previsto no art. 13 da CADH. A restrição imposta viola, segundo a Corte, não só o direito de expressão de um indivíduo, mas o direito de toda a sociedade em receber informações.
3º) Veículos de imprensa e o direito à liberdade de expressão como pedra angular de uma sociedade democrática: segundo a Corte Interamericana de Direitos Humanos, em um caso em que o Estado venezuelano suprimiu a frequência do sinal da famosa Rádio Caracas Televisión (RCTV), a qual produzia matérias jornalísticas contrárias ao governo, o direito à liberdade de expressão configura uma pedra angular de uma sociedade democrática. Embora adotando a compreensão de que a CADH não se aplica às pessoas jurídicas, entendeu-se que as vítimas do caso são os diretores, os acionistas, os jornalistas e os trabalhadores da RCTV.
A propósito, nos termos do entendimento da Corte Interamericana, a liberdade de pensamento e de expressão, prevista no art. 13 da CADH, possui uma dimensão individual e uma dimensão coletiva.
Na dimensão individual, há o direito de utilizar-se de qualquer meio apropriado para difundir opiniões, ideias e informações, de modo que tais opiniões, ideias e informações cheguem ao maior número possível de pessoas. Nesse sentido, a expressão e a difusão são indivisíveis, de modo que as restrições às possibilidades de divulgação representam diretamente, e na mesma medida, um limite ao direito de expressar-se livremente.
Já, na dimensão coletiva, a liberdade de expressão e de manifestação do pensamento engloba o direito de todas as pessoas de conhecer opiniões, relatos e notícias vertidas por terceiros.
Quando o Poder Público impede a livre circulação de informações, provoca-se uma violação radical não apenas ao direito que tem cada um de se expressar, mas, também, ao direito de todas as pessoas em ser informadas, ou seja, uma das condições básicas de uma sociedade democrática.
Considerando-se que a democracia é um ambiente propício para a concretização dos direitos humanos, uma das formas de a democracia manifestar-se é por meio da liberdade de expressão, particularmente a liberdade de imprensa. Esta última, portanto, é uma garantia fundamental institucional privada, que viabiliza a manifestação da liberdade de pensamento e a realização de outros direitos humanos.
Como garantia fundamental institucional privada, temos não apenas o veículo de imprensa propriamente dito, mas, também, a própria atividade desempenhada pelos jornalistas. Nesse sentido, provocará um grave arranhado à democracia e à liberdade de expressão criar obstáculos de atuação não só à empresa jornalística, mas, igualmente, ao jornalista.
Daí a proibição do assédio judicial aos jornalistas, que consiste na propositura de diversas ações, relacionadas ao mesmo fato jornalístico, contra o mesmo jornalista e em diversas Comarcas. Para viabilizar o direito de defesa e a própria liberdade de expressão, o jornalista acionado poderá solicitar que as demandas sejam reunidas no foro do domicílio desse profissional. A propósito, confira-se tese de repercussão geral firmada pelo Supremo Tribunal Federal:
“1. Constitui assédio judicial comprometedor da liberdade de expressão o ajuizamento de inúmeras ações a respeito dos mesmos fatos, em comarcas diversas, com o intuito ou o efeito de constranger jornalista ou órgão de imprensa, dificultar sua defesa ou torná-la excessivamente onerosa; 2. Caracterizado o assédio judicial, a parte demandada poderá requerer a reunião de todas as ações no foro de seu domicílio. 3. A responsabilidade civil de jornalistas ou de órgãos de imprensa somente estará configurada em caso inequívoco de dolo ou de culpa grave (evidente negligência profissional na apuração dos fatos)” (STF, Plenário, ADIs 6.792 e 7.055, Relator Ministra ROSA WEBER, Redator do acórdão Ministro ROBERTO BARROSO, julgamento finalizado no dia 22/5/2024). |