Os direitos humanos são essenciais a uma vida digna. Tais direitos, por isso, são intangíveis, isto é, não podem ser mexidos, destruídos. A intangibilidade dos direitos implica dizer, então, que os direitos humanos têm como características a imprescritibilidade, a inalienabilidade e a indisponibilidade ou irrenunciabilidade.
A imprescritibilidade quer dizer que os direitos humanos continuam a existir mesmo com a passagem do tempo, bastando que o ser humano exista. A inalienabilidade consiste em proibir a atribuição pecuniária aos direitos humanos, os quais, por isso, não estão sujeitos à venda. A indisponibilidade ou irrenunciabilidade significa que o ser humano não pode abrir mão dos direitos humanos dos quais ele, ser humano, seja titular.
A intangibilidade dos direitos deve ser admitida apenas em abstrato. Em concreto, é possível, dentro de certas condições, dispor de certos (disponibilidade), negociar certos direitos (alienabilidade) ou perder certos direitos mediante o decurso do tempo (prescritibilidade).
Assim, há o direito social à irredutibilidade dos salários, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo (CF/88, art. VI). Há, também, o direito social à duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, mas se faculta a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho (CF/88, art. 7º, XIII). Há, ainda, o direito social à jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva (CF/88, art. 7º XIV). Nota-se que, dentro de certos limites constitucionais, os citados direitos sociais podem ser objetivo de negociação (alienabilidade) e de disponibilidade parcial (disponibilidade ou renunciabilidade).
Não bastasse, a ação judicial para obter os créditos trabalhistas deve observar um prazo prescricional de 5 anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho (CF/88, art. 5º, XXIX). Nota-se que os direitos trabalhistas com conteúdo econômico submetem-se a um prazo prescricional (prescritibilidade).
Vimos, até aqui, restrições possíveis à inalienabilidade, indisponibilidade e à imprescritibilidade dos direitos humanos.
Por outro lado, a indisponibilidade não pode ser afastada, se a situação provocar tratamento humilhante, cruel e degradante ao ser humano, mesmo com a concordância do titular do direito. É que não se pode admitir que as pessoas sejam tratadas como objeto. Por isso, corretamente, o Conselho de Estado francês (Decisão do Conseil d’État, de 27 de outubro de 1995, nº 136727, Commune de Morsang-sur-Orge.) e o Comitê de Direitos Humanos do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos proibiram uma casa noturna, em Morsang-sur-Orge (periferia de Paris, França), de praticar a atividade de remessa de pessoa com nanismo – mesmo com a concordância do titular do direito e mesmo com o oferecimento de equipamentos de segurança (RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos, pág. 74. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2024).
Na mesma linha, para evitar que as pessoas sejam tratadas como objeto e sujeitas a tratamento cruel e degradante, o Tribunal Constitucional da Alemanha considerou inconstitucional dispositivo da lei de segurança aérea. Esse dispositivo permitia o abate de aviões comandados por terroristas, ainda que os passageiros fossem pessoas inocentes. Bastava ter dados de que o avião fosseatingir pessoas inocentes em solo. Considerou-se que esse abate instrumentalizava pessoas inocentes (passageiros), com o objetivo de salvar outras vidas, o que violava o direito à vida e à dignidade humana – ainda que, ao final, os passageiros inocentes acabassem sendo mortos. No mesmo sentido, não se pode admitir o abate de aeronaves nos casos de suspeita de que a aeronave transporta drogas para fins de tráfico. A propósito, a “Lei do Abate” admite a medida de destruição de aeronave em situações que especifica. Trata-se da Lei nº 9.614/98, que incluiu o §3º no art. 303 do Código Brasileiro de Aeronáutica. O abate de aeronave que transporta drogas foi autorizado pelo Decreto nº 5.144/2004, que regulamenta os §§1º a 3º do art. 303 do Código Brasileiro de Aeronáutica.
Por outro lado, a indisponibilidade ou irrenunciabilidade dos direitos humanos não pode impedir, em certas situações, a autonomia da vontade. Por isso, nada impede, em um ambiente de consentimento informado, que uma pessoa abra mão da privacidade e participe de reality show. Nada impede, também, que uma pessoa faça tatuagens, dispondo, em parte, da integridade física. Nessas situações, a proibição das condutas implicaria indevido paternalismo estatal, não condizente com a autonomia da vontade e a liberdade de que desfrutam as pessoas (RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos, pág. 74. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2024).
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