Os direitos humanos apresentam várias terminologias diferentes. Várias são as terminologias que, no decorrer dos tempos, foram utilizadas para expressar aqueles direitos essenciais à dignidade humana.
Esses termos aparecem seja em normas jurídicas de direito interno, bem assim em normas jurídicas internacionais.
A seguir, apontaremos cada uma delas, com os apontamentos e críticas que cada uma delas merece.
Desde já, é importante esclarecer que, no século XXI, as expressões que vêm sendo utilizados, com maior frequência, são direitos humanos e direitos fundamentais. Confira-se, além disso, qual o CONCEITO DE DIREITOS HUMANOS.
1. DIREITOS DO HOMEM E DIREITOS FUNDAMENTAIS DO HOMEM
Direitos do homem configura expressão que aparece na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789). Essa declaração, marcada pelo racionalismo liberal, propunha uma hipotética igualdade entre todos os seres humanos.
Há uma marca jusnaturalista na expressão direitos do homem, quando as revoluções liberais se põem a lutar contra o absolutismo estatal, afirmando aqueles direitos inerentes à natureza.
Contudo, o movimento que reivindicava os direitos das mulheres na época já defendia a ideia de que a expressão direitos do homem revelava a intenção, da Revolução Francesa, de negar voz e participação no espaço público às mulheres. Olympe de Gouges foi a redatora da Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã (1791). Essa mulher foi guilhotinada, sob a acusação de que desejava ser um homem de Estado, esquecendo-se das virtudes próprias do sexo masculino¹.
Portanto, a expressão direitos do homem é inegavelmente machista, escondendo uma profunda discriminação contra as mulheres, cujos direitos acabam por ser desconsiderados, na medida em que os direitos só diriam respeito aos homens.
Direitos fundamentais do homem é uma locução que aparece, também, no preâmbulo da Declaração Universal de Direitos Humanos (1948) e comporta a mesma crítica que fizemos à locução direitos do homem.
2. LIBERDADES FUNDAMENTAIS
Essa expressão aparece no art. 55, alínea c, da Carta da ONU.
3. LIBERDADES PÚBLICAS, DIREITOS PÚBLICOS SUBJETIVOS E DIREITOS INDIVIDUAIS
Trata-se de locução provinda da França. A crítica que se faz é que liberdades públicas envolvem apenas os direitos de natureza individual, em que se exige do Estado um dever de abstenção. Ficam de fora os chamados direitos sociais e econômicos, que exigem uma postura ativa do Estado na concretização desses direitos.
No direito alemão, temos os direitos públicos subjetivos. O sentido, aqui, é muito semelhante às liberdades públicas, comportando, então, a mesma crítica.
Liberdades públicas, direitos públicos subjetivos e direitos individuais são expressões sinônimas.
4. DIREITOS HUMANOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS
Direitos humanos e direitos fundamentais são expressões costumeiramente utilizadas no século XXI, para designar aqueles direitos essenciais à dignidade humana.
Não obstante, há uma grande confusão no emprego dos dois termos, os quais se distinguem pelo lugar onde os direitos estão previstos e pela exigibilidade judicial desses direitos.
Assim, quanto ao lugar onde os direitos estão previstos, os direitos humanos encontram-se em normas jurídicas internacionais. Já os direitos fundamentais estão previstos em normas jurídicas de direito interno, especialmente nas Constituições.
A Constituição brasileira parece ter adotado essa distinção. Em três passagens podemos observar isso.
Assim, segundo o art. 5º, §1º, “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”. Nesse caso, a Constituição alude aos direitos previstos na própria Constituição: os direitos fundamentais.
Já, no art. 5º, §3º, está escrito o seguinte: “os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”. Nessa passagem, a Constituição brasileira vincula os direitos humanos à ideia de tratados e convenções internacionais.
Por sua vez, dispõe o art. 5º, §2º: “os direitos e garantais expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. Na primeira parte do dispositivo – direitos expressos nesta Constituição – o legislador, sem citar o nome, refere-se aos direitos fundamentais. Na segunda parte, quando alude aos tratados internacionais, o legislador, também sem citar o nome, está-se referindo aos direitos humanos.
Assim, o art. 5º, §2º, da Constituição brasileira se refere, indistintamente, aos direitos previstos na ordem interna e na ordem internacional. Por isso, não fez menção expressa aos direitos fundamentais e aos direitos humanos.
Em suma, nos §§ 1º a 3º, do art. 5º, a Constituição da República Federativa do Brasil adotou o entendimento de que os direitos fundamentais são aqueles positivados na Constituição, ao passo que os direitos humanos são aqueles previstos em normas jurídicas internacionais.
Quanto à exigibilidade judicial dos direitos, os direitos humanos, previstos no direito internacional, não podem ser exigíveis internamente, tendo em conta que tais direitos constituem, quando muito, realizações de direito natural, e não direitos protegidos pelo direito interno. Já os direitos fundamentais, por virem previstos em normas constitucionais, são passíveis de exigibilidade judicial.
Embora adotadas em provas de concursos públicos, é preciso esclarecer que ambas as distinções têm se diluído nos atuais sistemas nacionais e internacionais de proteção de direitos.
Quanto ao lugar onde os direitos estão previstos, nota-se que vários direitos são encontrados, ao mesmo tempo, em normas jurídicas de direito interno e de direito internacional. Em razão disso, não é possível dizer se o direito tutelado constitui apenas um direito fundamental ou somente um direito humano.
Tomemos como exemplo os seguintes direitos, previstos tanto em normas internacionais quanto em normas nacionais brasileiras: a) direito à vida: art. III da Declaração dos Direitos Humanos (DUDH) e no art. 5º, caput, da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB/88); b) acesso à justiça: previsto no art. 25 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH) e no art. 5º, inciso XXXV, da CRFB/88; c) direito à liberdade: arts. I e III, da DUDH e art. 5º, caput, da CRFB/88; d) direito à propriedade: DUDH, art. XVII; CFRB, art. 5º, caput; e) direito à saúde: DUDH, art. XXV; CRFB, arts. 6º e 7º; f) direito ao meio ambiente: (Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos – PIDCP, art. 1º, item 2; CRFB, art. 225.
Não bastasse isso, é possível verificar que diplomas jurídicos internacionais fazem menção aos direitos fundamentais, ao passo que o direito nacional também se refere aos direitos humanos. Exemplo do primeiro caso é a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia; do segundo, o art. 4º, inciso II, e o art. 109, §5º, da Constituição da República Federativa do Brasil.
Em suma, no que se refere ao lugar onde estão previstos os direitos, é possível chegar a duas conclusões: a) há direitos previstos, ao mesmo tempo, em normas internacionais e em normas nacionais; b) há normas internacionais que fazem alusão aos direitos fundamentais, ao passo que há normas nacionais que aludem aos direitos humanos.
Por sua vez, quanto ao segundo aspecto de distinção, ou seja, a possibilidade de exigibilidade judicial, não parece correto afirmar que apenas os direitos fundamentais sejam passíveis de proteção judicial. Isso porque, no caso de falha estatal na proteção de direitos previstos internacionalmente, é possível, no Brasil, que a proteção judicial seja feita pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Isso porque o Brasil se submete à jurisdição da Corte Interamericana, a cuja sentença, que é definitiva e inapelável, todos os órgãos estatais brasileiros devem-se sujeitar. É que, segundo o art. 68.1 da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), “os Estados Partes na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todos os casos em que forem partes”.
Assim, em havendo inexistência ou insuficiência de proteção judicial no Brasil, o direito essencial à dignidade humana pode vir a ser protegido pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Essa proteção judicial interamericana revela que os direitos, previstos na Convenção Americana de Direitos Humanos, isto é, os direitos humanos, caso não protegidos internamente, poderão ser exigidos, judicialmente, na esfera internacional.
Daí ser incorreto dizer que os direitos humanos sejam carentes de proteção judicial – não o são. Se a proteção judicial no plano interno for insuficiente ou inexistente, é possível que a proteção judicial seja alcançada no plano internacional.
Em resumo, quanto aos direitos humanos e aos direitos fundamentais: a) são expressões encontradas tanto no direito interno quanto no direito internacional, caindo por terra a classificação que os tomam, respectivamente, como direitos objeto de normas internacionais e direitos objeto de normas internas; b) não só os direitos fundamentais, mas, também, os direitos humanos são passíveis de exigibilidade judicial.
Não bastasse isso, há mais um dado que aproxima os direitos humanos e os direitos fundamentais. Segundo o art. 5, §2º, da Constituição brasileira, os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela elaborados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
Quando a Constituição fala em direitos e garantias expressos nesta Constituição, ela está fazendo referência aos direitos fundamentais. Logo depois, a mesma Constituição estipula que os direitos e garantias expressos na Constituição, isto é, os direitos fundamentais não excluem outros decorrentes dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte, isto é, os direitos humanos.
Em outras palavras, os direitos fundamentais não excluem a existência dos direitos humanos. Foi bem isso o que quis dizer a Constituição brasileira de 1988.
Mais do que isso.
A mesma Constituição, no art. 5º, §3º, estabeleceu que os tratados e convenções internacionais de direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.
Por esse raciocínio, os direitos humanos, que estão em normas internacionais, passarão a fazer parte da Constituição brasileira, desde que se observe o rito de aprovação previsto na referida norma.
Isso significa que os direitos humanos, depois de incorporados como normas constitucionais, transformam-se em direitos fundamentais. De qualquer forma, por continuarem ainda previstos em normas internacionais, esses direitos, transformados em direitos fundamentais, não perdem a natureza de direitos humanos.
Assim, pela conjugação dos §§2º e 3º do art. 5º da Constituição, há uma grande aproximação entre os direitos humanos e os direitos fundamentais: a) os direitos fundamentais não excluem os direitos humanos (§2º); b) os direitos humanos, desde que aprovados pelo rito das emendas constitucionais, transformam-se em direitos fundamentais (§3º).
Nesse sentido, podemos estabelecer 4 (quatro) motivos de intensa aproximação entre os direitos humanos e os direitos fundamentais, o que praticamente dissolve a diferenciação que se promove entre os dois institutos: a) ambos estão previstos em normas jurídicas nacionais e internacionais; b) ambos são passíveis de proteção judicial; c) os direitos fundamentais não excluem os direitos humanos; d) os direitos humanos, desde que aprovados sob o rito das emendas constitucionais, podem-se transformar em direitos fundamentais.
De qualquer forma, em concurso público, ainda é possível encontrar questões que aceitem as diferenças entre ambas as locuções. Em uma prova de segunda fase, uma dissertação que adote a crítica que aqui estabelecemos poderia enriquecer a argumentação.
5. TERMINOLOGIA UTILIZADA NA EUROPA
No plano da União Europeia, a expressão direitos fundamentais tem servido para designar os direitos protegidos na esfera internacional regional europeia.
Assim, em termos de União Europeia, o instrumento protetivo de direitos é a chamada Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.
Sabe-se que a União Europeia é composta atualmente por 27 países – depois da saída do Reino Unido, no dia 31 de janeiro de 2020.
Já o Conselho da Europa abrange todos os países europeus, e não apenas os 27 que fazem parte da União Europeia. No âmbito do Conselho da Europa, o instrumento protetivo de direitos é denominado de Convenção Europeia de Direitos Humanos. Aqui se nota que a expressão direitos humanos se liga a um diploma normativo de direito internacional.
Se, na União Europeia, temos a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, no âmbito do Conselho da Europa, o instrumento protetivo dos direitos é a Convenção Europeia de Direitos Humanos.
6. DIREITOS HUMANOS E DIREITOS DE CIDADANIA
Os direitos humanos são os direitos do ser humano enquanto tal. Já os direitos de cidadania são aqueles direitos do ser humano enquanto pertencente a uma comunidade política.
Essa diferença advém da Declaração francesa de Direitos, de 1789, denominada de Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Nota-se, aí, uma diferença entre direitos do homem (ou direitos humanos) e direitos do cidadão (ou direitos de cidadania).
Nota-se, portanto, que os direitos humanos são aqueles direitos que pertencem a todas as pessoas. Por isso, são direitos universais e naturais, conforme uma corrente de pensamento aceita por algumas bancas de concurso público.
Já os direitos de cidadania se referem aos naturais de um país, possuindo, assim, um alcance mais restrito que os direitos humanos.
7. TERMINOLOGIAS UTILIZADAS PELA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA
A Constituição da República Federativa do Brasil utiliza-se de várias terminologias, para se referir aos direitos essenciais à dignidade do ser humano.
No art. 4º, inciso II, a Constituição alude aos direitos humanos. No caso, o legislador constituinte adotou aquele entendimento segundo o qual os direitos humanos são aqueles direitos protegidos por normas jurídicas internacionais. Isso porque, nos termos do referido dispositivo constitucional, a prevalência dos direitos humanos foi tida como princípio prevalente nas relações internacionais em que toma parte a República Federativa do Brasil.
No Título II, a Constituição se utilizou da expressão direitos e garantias fundamentais. Como, no decorrer do Título II, há um elenco de vários direitos, o legislador adotou aquele entendimento segundo o qual os direitos fundamentais revelam aqueles direitos positivados na Constituição.
Já, no art. 5º, inciso XLI, a Constituição empregou a expressão direitos e liberdades fundamentais, ao determinar que a lei deverá punir qualquer discriminação atentatória desses direitos e liberdades fundamentais.
Por sua vez, no art. 5º, inciso LXXI, ao prever o mandado de injunção, o legislador constitucional referiu-se aos direitos e liberdades constitucionais.
O art. 5º, §1º, faz referência aos direitos e garantias fundamentais, ao passo que o art. 17 fala em direitos fundamentais da pessoa humana, e o art. 34, inciso VII, alínea b, em direitos fundamentais da pessoa humana.
Quando o legislador constitucional disciplina a intervenção federal, a escolha é por direitos da personalidade humana (CRFB, art. 34, inciso VII, alínea b).
Já, no tema das cláusulas pétreas, a expressão utilizada foi direitos e garantias individuais (CRFB, art. 6º, §4º).
No art. 7º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), o legislador constituinte fez menção a um tribunal internacional dos direitos humanos.
Em suma, a Constituição brasileira faz uso de várias expressões para se referir aos direitos essenciais à vida digna. No entanto, quando emprega direitos humanos e direitos fundamentais, o legislador constituinte parte do pressuposto de que os primeiros são aqueles direitos assegurados internacionalmente, ao passo que os segundos são os direitos previstos na Constituição.